
A flexibilidade na jornada de trabalho tem ganhado cada vez mais espaço nas estratégias de gestão de pessoas, impulsionada por mudanças sociais, avanço tecnológico e, mais recentemente, pela consolidação do trabalho remoto. Empresas que oferecem modelos mais flexíveis observam benefícios como aumento da produtividade, retenção de talentos e redução de custos operacionais.
Contudo, a jornada de trabalho flexível, se não for bem regulamentada, pode se tornar um risco jurídico. Horas extras não controladas, intervalos desrespeitados e falta de clareza contratual podem resultar em passivos trabalhistas relevantes.
Neste artigo, você entenderá como estruturar juridicamente modelos de jornada flexível sem expor sua empresa a riscos legais, observando as exigências da CLT, jurisprudência atual e melhores práticas para proteção do empregador.
O que é jornada de trabalho flexível?
A jornada flexível é aquela que permite variações de horário de entrada, saída e até de dias trabalhados, desde que respeitados os limites legais. Ela pode assumir diferentes formatos, como:
- Horário móvel: o colaborador escolhe seu horário de entrada e saída dentro de uma faixa pré-determinada.
- Banco de horas: horas extras são compensadas com folgas, em vez de serem pagas.
- Escala 12×36 ou 6×1: alternância de jornadas com folgas preestabelecidas.
- Jornada parcial ou reduzida: acordo para carga horária menor, com proporcionalidade de salário e benefícios.
- Trabalho por produção ou tarefa: remuneração desvinculada de controle de horas, quando aplicável.
Cada modelo exige cuidados específicos para que a flexibilidade não configure descumprimento da legislação trabalhista.
O que diz a legislação brasileira
A jornada padrão prevista na CLT é de até 8 horas diárias e 44 horas semanais, com direito a intervalo para refeição e descanso (mínimo de 1 hora e máximo de 2 horas em jornadas superiores a 6 horas).
Com a Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017), a legislação passou a permitir maior negociação entre empregador e empregado, inclusive com a formalização de acordos individuais para:
- Banco de horas com compensação em até 6 meses;
- Jornada parcial com até 30 horas semanais;
- Compensação de jornada dentro do mesmo mês;
- Intervalo intrajornada reduzido para 30 minutos, mediante negociação coletiva.
Mesmo com a flexibilização, a empresa continua responsável por respeitar os direitos do trabalhador, controlar a jornada e registrar os horários corretamente, conforme Portaria 671/2021 do Ministério do Trabalho.
Riscos legais da jornada de trabalho flexível
A adoção de modelos flexíveis sem regulamentação clara pode gerar os seguintes riscos:
- Ações trabalhistas por horas extras não pagas;
- Indenizações por supressão de intervalos obrigatórios;
- Autuações fiscais por ausência de controle de jornada;
- Reconhecimento judicial de vínculo de emprego com pagamento retroativo de verbas;
- Penalidades administrativas por descumprimento de normas coletivas ou legais.
Empresas que negligenciam a gestão da jornada, mesmo com boas intenções, correm o risco de arcar com custos elevados em disputas judiciais.
Como regulamentar a jornada flexível corretamente
1. Formalização por escrito no contrato de trabalho ou aditivo
Toda jornada especial, seja reduzida, parcial, móvel ou por compensação, deve constar expressamente em cláusula contratual, aditivo ou acordo coletivo.
Detalhe os seguintes pontos:
- Tipo de jornada;
- Faixa de horário permitido;
- Regras de compensação ou banco de horas;
- Registros de ponto (quando aplicável).
2. Acordo ou convenção coletiva
Quando a jornada envolver compensações complexas, banco de horas com período superior a 6 meses, ou redução de intervalo intrajornada, é obrigatória a negociação com o sindicato da categoria.
A empresa deve manter cópia atualizada da convenção coletiva e adaptar suas práticas às regras estabelecidas.
3. Controle de jornada
A empresa deve manter controle de jornada eletrônico, mecânico ou manual, especialmente para empregados sujeitos a regime de tempo.
Soluções digitais, com login e registro remoto, são aceitas desde que:
- Respeitem as regras da Portaria 671/2021;
- Permitam acesso do trabalhador às marcações;
- Garantam integridade e segurança dos dados.
4. Política interna clara e acessível
Crie e implemente uma política de jornada flexível que oriente gestores e colaboradores sobre:
- Limites de horas por dia e semana;
- Compensações permitidas;
- Agendamento de folgas;
- Responsabilidade por marcações.
O documento deve ser assinado pelo colaborador e incorporado ao regulamento interno.
5. Treinamento de lideranças
Gestores devem ser treinados para aplicar corretamente os modelos de jornada, fiscalizar o cumprimento e evitar pressões que gerem sobrejornada ou violações de descanso.
Lideranças despreparadas são uma das principais fontes de riscos trabalhistas.
6. Revisão periódica da prática adotada
A flexibilidade deve ser monitorada com relatórios de horas extras, adesão às faixas horárias e auditorias internas. Caso o modelo esteja gerando desvios, a política pode ser ajustada.
Casos em que a flexibilização é mais indicada
- Empresas com equipes híbridas ou remotas;
- Operações com turnos alternados (comércio, saúde, segurança, TI);
- Startups e ambientes que valorizam autonomia e produtividade por tarefa;
- Setores que operam com sazonalidade ou carga de trabalho variável.
Cada segmento pode adotar a jornada mais compatível com sua realidade, desde que com base jurídica sólida e respeito à legislação vigente.
A jornada de trabalho flexível é uma ferramenta moderna e estratégica para empresas que buscam inovar na gestão de pessoas, aumentar a produtividade e atender às novas exigências do mercado de trabalho. No entanto, sua implementação exige atenção técnica, respaldo legal e procedimentos internos bem estruturados.
Ignorar os aspectos jurídicos da jornada pode transformar um benefício em passivo, com ações trabalhistas, autuações e desgaste da imagem corporativa.
Com um modelo bem planejado, formalizado e alinhado à legislação, é possível adotar jornadas flexíveis com segurança jurídica e previsibilidade trabalhista.
Sobre o Nobre Advogados
O Nobre Advogados é um escritório especializado em Direito do Trabalho Empresarial, atuando na assessoria preventiva e contenciosa de empresas de diversos segmentos. Nossa equipe orienta desde a estruturação de políticas internas de jornada até a elaboração de contratos, acordos coletivos e defesa em reclamações trabalhistas.
Se sua empresa deseja implementar ou revisar o modelo de jornada flexível, o Nobre Advogados está pronto para oferecer segurança jurídica, personalização e alinhamento com a legislação atual.
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